segunda-feira, 20 de outubro de 2014

A Mudez do Verbo Ir





Já não há o que dizer. Sinto que as palavras secaram em meu paladar. Você me olha com seus olhos questionadores, que buscam nos meus, uma resposta que eu não posso dar. Na verdade, não sei como fazê-lo. Você sempre tem algo a dizer. Parece que as palavras brotam de sua boca como flores silvestres. Mas eu... Não tenho o que dizer. A verdade é que eu me perdi em seu meu mundo e já nem sei o caminho de volta. Só sei que caminho em uma mesma direção e não consigo mudar de rumo. Já nem escuto o que você diz. Estou distante de tudo o que nós somos ou éramos. Não consigo distinguir mais a sua voz entre tantas outras que ouço neste meu caminhar. Parece que escolhi ser sozinha, mesmo quando você estava ao meu lado. E quanto mais eu caminho, mais me perco de você e me encontro em mim. E, a cada dia, escolho ser menos o que você queria que eu fosse, e sou, cada vez, mais aquilo que na verdade sou. Parece que foi necessário me perder de tudo o que éramos; de tudo o que era você em mim, para que eu me tornasse esta que sou agora. Olho ao redor e ouço apenas o eco que o vazio da sua ausência me causa. Sinto que posso preencher-me com tantas pessoas, e coisas e mundos inteiros, que tenho a impressão de que já não faz sentido mantê-lo em mim. Já não faz sentido isso que somos ou que isto que acreditamos ser. Vejo a estrada a minha frente e não sinto medo. A estrada me puxa enquanto ainda sinto sua mão que segura a minha. Seus olhos fixos nos meus passos que teimam em andar no sentido contrário ao que você está. Adiante. Vejo uma clara decepção quando miro seu olhar de perguntas prontas. Mas não há o que dizer. Já não sinto paz em nada disso. O mundo que se abre a minha frente me parece tão imenso, e eu não tenho tanto tempo. Preciso que o tempo esqueça que é tempo, e me conceda mais um tempo. Você que me olha e me prende, não entende que este mundo tão pequeno que temos juntos não é mais suficiente. Não ocupa o espaço e o tempo que deveria. Volto os olhos para a estrada e meu único desejo é sentir que estou cheia de novo. Repleta desses mundos imensos que se abrem para mim num abrir e fechar de olhos. Me libero das amarras que me prendem a você. Lanço fora as sandálias dos meus pés, o pequeno chapéu de palha em minha cabeça e por fim, solto sua mão forte que desde o início prendia a minha. E você, que é sempre cheio de palavras, se vê mudo. E eu, apenas sigo.